PAINTINGS / FRANCISCO HURTZ
MODEL / FACUNDO PELLEGRINO, LUCIANO RIVAROLA
ORIGINAL PHOTOGRAPHY / ARMANDO FREZZE
TXT / ROGERIO LACERDA
FOR DOOPLER MAGAZINE
Não quero falar em Queer Art, Homo Art, Homoerotismo na arte contemporânea e nem tão pouco na história da arte. Não quero as classificações, adjetivações já basta de guetos. Talvez na década de 80 nos Estados Unidos, Europa e também aqui na America Latina essas categorias para algo teriam maior sentido. Mas hoje não para mim. Vamos pensar em Felix Gonzalez- Torres, Wolfgang Tillmans, Leonilson, Hudnilson Jr., Rennan Lourenço, Daniel Barkley, Martin- Jan Van Santen, Robert Mapplethorpe e até mesmo a literatura de Jean Genet e etc…alguns nomes e uma infinidade de poéticas distintas assim é que consigo enxergar e não existe o porque categorizar. Penso que todo rotulo é perigoso ao passo que reduz estigmatiza ou trás consigo toda uma carga de referencias que hoje pouco interesse. Algumas décadas atras o poeta alemão B.Brecht em um poema sublime afirma: “ Realmente vivemos em tempos sombrios!” E porque o cito nesse contexto? Porque considero toda manifestação artística como um ato politico? Não sei ainda mas tão pouco me apresso em buscar respostas.
Quero falar do trabalho e obra de Francisco Hurtz, brasileiro como eu e que também vive nessa cidade caótica chamada São Paulo. Pouco conhecia seu trabalho, mas através do convite da Doopler Magazine para escrever uma nota sobre seu trabalho. Debrucei -me dias frente ao computador pesquisando, lendo suas entrevistas, poemas e principalmente mergulhando no universo de seus desenhos, pinturas e fotografias. Uma grata surpresa.
Francisco não entende seu trabalho como estritamente ativista, é um questionador perspicaz e sensível ao mundo em sua volta. Não busca doutrinar e muito menos ser um panfletário e acredito que se assim fosse talvez seu trabalho não despertasse tanta a força e encanto. Francisco, Eu e Nós vivemos em um momento aonde já não podemos sustentar abordagens machistas, não podemos não nos ater as questões relativas a identidade de gênero se há de romper com a ideia de comportamento masculino vigente.Quanta poesia existe na diversidade na singularidade para nos deixar levar na onda de um machismo pré fabricado?
A nudez masculina perpassa os séculos. Hoje para alguns ela ainda incomoda. Mas ela esteve na Antiga Grécia, no período Classico Grego, na Roma antiga, foi vista como pecaminosa na Idade Média, entretanto retorna no Renascimento e assim segue presente até o advento da fotografia e como não pensar nas fotos de Von Gloeden no século XIX? Em cada tempo a nudez masculina representou e questionou a sociedade de seu tempo. Más é no século XX que estranhamente ela é castrada, marginalizada, restrita as revistas gays ou ao fascinante universo da pornografia.
Quando institucionalizada é lacrado nos conceitos Queer Art, Homo Art e etc…Em detrimento da nudez feminina que é cada vez mais explorada e hegemonicamente aceita. Mas o homem parece já não dever mais exibir sua nudez. Que tempos sombrios são esses? Quando para mim um corpo nu nada mais simboliza que a beleza e a fragilidade da natureza humana. Mas talvez o comportamento masculino deixou de aceitar sua nudez para não denotar sua fragilidade e assim criar sua vã supremacia? Será essa a questão? Mas quero seguir como Francisco questionando e talvez buscando respostas.
Francisco Hurtz é um jovem artista. Possui o domínio na pintura que de longe são incrivelmente impactantes, somado a isso um primoroso conhecimento da história da arte o que o faz um grande propositor. Aos meus olhos são em seus desenhos que atinge o ponto mais intrigante de suas investigações e pesquisas. São de intensa beleza. Reproduzo aqui uma afirmação do artista feita para o jornalista Matheus Evangelista: “Costumo dizer que eu não desenho corpos, desenho fronteiras. A partir do momento que considero que os desenhos das linhas dos corpos são fronteiras, surge a possibilidade de investigar territórios onde esses corpos se inserem.”
Essa afirmação soa como uma poesia, e ele tem também o domínio da palavra. Mas quero falar desses territórios que os ditos corpos são inseridos. E que corpos são esses? Como são concebidos? São de traços precisos , minimalistas, o branco e o negro, não possuem rostos definidos são identidades a serem preenchidas, se entrelaçam, separam-se, são pares, trios…constroem formas, desenhos e as vezes desaparecem no vazio. Se chocam o observador? Afirmo apenas que não é possível passar ileso a sua poética.
É um novo homem que nasce ou renasce em cada composição ou situação criada. Quem são esses homens? Não importa eles estão no mundo, são múltiplos, eróticos, inocentes, alguns ostentam armas um sinónimo daqueles que tem o poder, há sexo, amor mas todos são incrivelmente belos em suas singularidades. Francisco despe violentamente a figura masculina da moral opressora, traz a leveza e a brisa de liberdade para esses corpos brutalmente encerrados em uma masculinidade insana e vã e é dai simplicidade concisa e instigante de sua obra.
Um questionamento continuo de padrões, amarras pré estabelecidos. E o que tudo isso importa?A clareza e a lucidez de um artista que pensa o universo ao se redor. A sensibilidade daquele que foge do discurso da arte contemporânea que em voltas e voltas parece interessada apenas discutir a legitimidade de seu papel e lugar no mundo. Francisco consegue o que poucos artistas hoje preocupam-se, pois em um mundo exausto de tantas imagens, nos convida a parar e a contemplar sua obra. Penso que são os grandes que desmontam a universalidade do juízo de gosto e nos oferecem a contemplação estética.
Propositores, plantam perguntas, fomentam a discussão e essas talvez sejam algumas das funções da arte. Mas por favor não vamos categorizar ou rotular a diversidade de poéticas. Libertemo-nos nossos corpos de tantas amarras e vamos dançar junto aos desenhos de Francisco.
Para esta edição da Doopler Magazine, Francisco realizou uma obra com base em uma foto do fotógrafo Armando Frezze. Um 69 artístico.